Uma multiplicidade de povos, civilizações e crenças religiosas diferentes e opostas deu origem a uma simbiose particular de identidade reconhecível com aquele pluriverso mediterrânico, cuja memória histórica quase desapareceu nos dias de hoje. O Ocidente concebe hoje o Mediterrâneo como um lago atlântico. Esta Europa, reduzida a uma periferia atlântica, terá de desconstruir o fundamentalismo globalista americano e redescobrir a sua vocação mediterrânica, a fim de se projectar no Oceano Médio. Mas quem fará o pluriverso mediterrânico ressurgir do esquecimento secular?
Mediterrâneo: epicentro do conflito entre a civilização e a barbárie atlântica
Encontramo-nos no limiar de uma era de transição. A guerra entre os EUA e a Rússia na Ucrânia, com a sua crise energética, bem como a pandemia, seguida do incípito da quarta revolução industrial e da transição ambiental, são acontecimentos destinados a perturbar os equilíbrios geopolíticos pré-existentes e com eles, o modelo político-económico neoliberal global. A região mediterrânica, já marginalizada no contexto geopolítico global, está destinada a assumir um papel de liderança na futura nova ordem mundial multipolar, desencadeada pelo declínio do unilateralismo americano.
Após o fim do bipolarismo da Guerra Fria, as costas mediterrânicas do sul e leste, além de terem sido devastadas pelas guerras do Médio Oriente e pelos conflitos das "Primaveras Árabes", tornaram-se o epicentro da migração em massa de África e da Ásia. O fenómeno migratório é inteiramente inerente ao modelo de desenvolvimento neoliberal global, que prevê a livre circulação de mercadorias, pessoas e capitais. Portanto, as migrações em massa, incluindo as tragédias no mar, são acontecimentos que fazem parte de um contexto socioeconómico global, em que os países mais atrasados são privados dos melhores recursos humanos necessários para o seu desenvolvimento e os países mais avançados importam massas de trabalhadores baratos para espremerem salários e tornarem as suas economias mais competitivas no mercado global.
Com o advento da UE, a assimetria económica, cultural e política entre o Norte e o Sul da Europa aprofundou-se. O desenvolvimento da Europa do Norte foi acompanhado pelo empobrecimento e subalternidade da Europa mediterrânica e pelo subdesenvolvimento acentuado dos países do Norte de África. Uma escala hierárquica de desenvolvimento e poder político foi assim determinada entre o Norte e o Sul da Europa, de acordo com os parâmetros do sistema económico neoliberal.
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