O circo (extraordinariamente perigoso) em que se tornou a UE fica patente nas recentes movimentações da Dinamarca e da Alemanha em relação ao presente momento geopolítico. A Comissão Europeia acrescenta a cereja no topo do bolo

Um recente relatório do Serviço Dinamarquês de Informações de Defesa (DDIS) alega que a Rússia poderá estar pronta para travar uma “guerra em grande escala na Europa dentro de cinco anos”, documento que causou êxtase entre aqueles que anseiam vender o “perigo russo” a qualquer oportunidade. Isto apesar da História nos ensinar que sempre foi ao contrário, que foram os europeus do Ocidente, que uma e outra vez, tentaram invadir a Rússia, sempre sem sucesso.

E depois há o mundo real. Ontem, o vice-presidente norte-americano JD Vance avisou que os EUA tomarão o controle militar da Gronelândia, com ou sem a a autorização de Copenhaga, e até viajará ao território já na sexta-feira, para “visitar os guardas da Força Espacial ali estacionados e verificar como está a segurança da Gronelândia.”

Então temos um insignificante reino escandinavo a lamuriar confabulações russas para a próxima década, enquanto os seus aliados atlânticos tomam conta do seu território sem pedir licença. Alguém viu ou ouviu os nossos políticos a se pronunciar sobre isto? E onde ficou então o histerismo de fanfarra colectivo anti-Trump do último mês? Como dizia Putin após a eleição americana: Já verão que daqui a nada estão todos em redor do Trump outra vez. Alguma dúvida?

Ao estrambótico anuncio dinamarquês, a inteligência alemã veio pouco depois dizer que Berlim já trabalha para preparar o país para uma contenda com a Rússia até 2030. O regresso do serviço militar obrigatório será o primeiro passo. O segundo é um gasto público no rearmamento e em infraestruturas (com fins militares, leia-se bem as entrelinhas), de 400 mil milhões de euros e mais 100 mil milhões para a “emergência climática”, a fórmula que Merz, chefe com licença de baixa da BlackRock Deustchland, decidiu comprar o voto e fazer business com os Verdes.

“Deutschland ist zurück!“ (a Alemanha está de volta!), exclamou euforicamente o novo chanceler, uma bravata que arrepia a coluna de qualquer bom alemão sempre que um “líder” aponta armas a Leste.

O gasto público do novo governo alemão promete relançar a economia estagnada do país, mas na realidade baseia-se na emissão de dívida, com os respectivos perigos associados. É uma questão de tempo, para a locomotiva voltar a parar.

A Comissão Europeia, liderada por outra teutónica da mesma estirpe, não quis ficar atrás, e apesar dos europeus ainda estarem a pagar a pesada factura da famosa “bazuca” de 750 mil milhões de euros da época da Covid, dívida para a qual Bruxelas acrescentou a aventura ucraniana, propõe-se agora encontrar mais 800 mil milhões (!) para aquilo que decidiu chamar de “urgência”. Von der Leyen afirmou que a “prontidão 2030” significa “ter rearmado e desenvolvido as capacidades para ter uma dissuasão credível” e “uma base industrial que seja uma vantagem estratégica”. Mas não haverá “base industrial” militar europeia nenhuma, mas sim norte-americana. Sim, a base industrial é a do malvado Trump!

Porque é que a antiga ministra da Defesa alemã, demitida em 2019 após a revelação do escândalo que lhe imputava a casos de corrupção na ordem das centenas de milhões de euros chama de “urgência“ à atual situação pela primeira vez em três anos, quando Rússia e EUA negoceiam finalmente a paz, é outra pergunta que fica no ar.

De volta a Berlim, o novo chanceler deixou claro que em termos geopolíticos o seu novo governo será à fiel à Ucrânia e a Israel. Sobre o genocídio de Gaza, perpetrado com armas alemães, nem uma palavra. Os responsáveis pela política externa e segurança da grande coligação CDU/CSU com o SPD também fizeram questão em dizer explicitamente que “as relações com os EUA continuam a ser de extrema importância”. Ora bem, começamos a falar alemão! É uma forma subtil de declinar o convite de Macron em fazer da capacidade nuclear francesa o escudo anti-míssil europeu e manter-se sob alçada norte-americana. Resta saber a que preço quer Trump negociar este capítulo.

O tardo-keynesianismo de Merz, aprovado de forma ilegal, propositadamente ainda na legislatura do governo anterior, mudando de facto a Constituição sem que o TC de Karlsruhe o tenha impedido, supõe também uma mudança das regras e do consenso económico a nível europeu. As possíveis consequências políticas destas movimentações económicas na Alemanha para o futuro da Europa e da zona Euro, por serem de grande alcance, ficarão para uma próxima entrega.

Peça traduzida do inglês para GeoPol desde New Eastern Outlook

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ByRicardo Nuno Costa

Editor-chefe da GeoPol, é licenciado em Ciência Política e Relações Internacionais, com estudos posteriores em Comunicação Política. Estagiou política internacional no DN, em Lisboa.

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