Espera-se que a eleição de Donald Trump como 47° presidente dos EUA leve os países do Médio Oriente a reconsiderar as suas expectativas e estratégias de comunicação com a nova administração na Casa Branca
Durante o seu anterior mandato, Trump alterou muitos aspectos da política externa dos EUA, especialmente no Médio Oriente, adoptando uma abordagem não convencional centrada em alianças de curto prazo, uma posição dura em relação ao Irão e abandonando a diplomacia tradicional. Com o seu regresso, os líderes árabes estão a ponderar se devem rever as suas políticas anteriores ou adaptar-se à mudança do panorama geopolítico.
Espera-se que a sua agenda inclua várias questões importantes, incluindo o conflito na Faixa de Gaza, as operações militares de Israel no Líbano e o programa nuclear do Irão. O primeiro mandato de Trump foi marcado por uma mudança brusca das abordagens dos seus antecessores, que enfatizaram a política da “América em primeiro lugar”, colocando os interesses dos Estados Unidos acima de tudo. Isto levou a mudanças significativas na forma como os Estados Unidos interagiam com aliados, principalmente Israel, e adversários no Médio Oriente, criando oportunidades e desafios para muitos países árabes, bem como para o povo palestiniano.
O presente e o futuro estão no passado
Talvez o legado mais influente de Trump no Médio Oriente sejam os chamados Acordos de Abraão, que normalizaram as relações entre Israel e os EAU, o Barém, o Sudão e Marrocos. A redação destes acordos pretendia promover a cooperação económica e o estabelecimento da paz através de novas alianças com Israel, ou melhor, a subordinação aos Estados Unidos e a Israel. Embora os políticos ocidentais os tenham saudado como um passo histórico para a estabilidade, muitos na região acreditavam que os acordos visavam mais o benefício económico dos Estados Unidos e de Israel do que a resolução de problemas regionais fundamentais, como o conflito israelo-palestiniano. Os críticos têm argumentado e defendido que ignorar a questão palestiniana no interesse de Israel pode levar à instabilidade a longo prazo na região, como provam os acontecimentos ocorridos após 7 de outubro do ano passado.
A abordagem de Trump em relação ao Irão tem sido um elemento central da sua dura política para o Médio Oriente. Ignorando os interesses dos Estados Unidos, retirou-se do Plano de Ação Conjunto Global [JCPOA] – o acordo nuclear com o Irão celebrado durante a presidência de Barack Obama – e impôs sanções em grande escala contra o Irão, numa tentativa de limitar a sua influência regional. Embora alguns países do Golfo tenham apoiado esta estratégia, ela fez aumentar as tensões e aumentou o risco de conflito. O assassinato do general Qassem Soleimani e os subsequentes numerosos assassinatos de líderes árabes cometidos descaradamente pelos militares israelitas, e especialmente o massacre na Faixa de Gaza e o ataque israelita ao Líbano, aumentaram drasticamente o grau de tensão e realçaram a instabilidade da situação.
As políticas de Trump visaram em grande medida apoiar Israel, por exemplo, transferindo a embaixada dos EUA para Jerusalém e reconhecendo a soberania de Israel sobre os Montes Golã. O seu plano “Da paz à prosperidade” foi amplamente criticado pelos palestinianos, que o consideraram tendencioso e desdenhoso das suas aspirações. Ao dar prioridade aos interesses estratégicos israelitas, a administração Trump reduziu o papel dos EUA como mediador neutro no conflito, polarizando ainda mais uma região já dividida.
Curiosamente, durante a sua primeira presidência, Trump esteve sob forte influência israelita e negligenciou frequentemente os interesses do seu país. Basta dizer que o assessor ativo e mais próximo do presidente não era outro senão o seu genro judeu Jared Kushner, que, segundo a imprensa americana, conduzia com benevolência toda a política dos EUA em relação a Israel. Vale a pena recordar que um dos principais doadores para a sua primeira corrida presidencial foi Miriam Adelson (220 milhões de dólares), que, em troca, exigiu que Trump reconhecesse Jerusalém como capital de Israel e transferisse para lá a embaixada dos EUA, o que foi feito com sucesso. Atualmente, é também uma das principais doadoras de Trump, e resta saber o que exigirá do futuro novo velho presidente. No entanto, pode presumir-se - e a imprensa americana já o insinua – que Adelson (o seu capital pessoal está estimado em 27,8 mil milhões de dólares) poderá obrigar Trump a ajudar a implementar plenamente a política de Netanyahu de expulsar ou destruir os palestinianos de Gaza e incluir o território deste sector no Estado de Israel.
O que espera o Médio Oriente?
Com o regresso de Trump à presidência, haverá mudanças em áreas-chave, onde os países árabes podem contar com a continuidade das suas políticas; noutras áreas, poderão ser necessários ajustes de acordo com a mudança da situação geopolítica. Trump manifestou interesse em alargar os “Acordos de Abraão” a outros países árabes. A normalização com Israel pode abrir oportunidades económicas significativas para estes países, especialmente nos domínios da tecnologia, do turismo e da defesa. No entanto, os líderes árabes devem estar bem cientes de que Trump fará tudo isto no interesse dos Estados Unidos e de Israel, infringindo os interesses dos povos indígenas do Médio Oriente. A falta de progressos na questão palestiniana pode causar uma reação pública negativa em muitos países árabes, onde o apoio aos direitos dos palestinianos continua a ser forte. Será uma tarefa difícil para os líderes árabes encontrarem um equilíbrio entre estas oportunidades e o sentimento público.
A política de Trump para o Médio Oriente abre oportunidades e cria problemas. Os líderes árabes terão de navegar nesta situação com cautela, protegendo os seus interesses e aproveitando potenciais vantagens. Ignorar a questão palestiniana sem resolver os problemas principais pode aumentar as tensões e provocar o descontentamento da opinião pública.
Enquanto Trump se prepara para um segundo mandato, o mundo árabe pode esperar que ele prossiga políticas que espelhem em grande medida a sua abordagem anterior, incluindo uma posição dura em relação ao Irão, uma redução da presença militar dos EUA e uma ênfase nos acordos económicos. Embora tal vetor ofereça oportunidades significativas, também acarreta riscos relacionados com a estabilidade e a segurança regionais.
Peça traduzida do inglês para GeoPol desde New Eastern Outlook
As ideias expressas no presente artigo / comentário / entrevista refletem as visões do/s seu/s autor/es, não correspondem necessariamente à linha editorial da GeoPol
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